O ano era nos 40. Meu pai já havia feito a passagem. A lembrança é de que ainda morávamos no Bairro Bonito, hoje chamado de Piedade. Os finais de semana, especialmente o domingo, eram esperados com alegria. Ainda mais para quem estava na plena adolescência, mesmo já contribuindo com o sustento da família.
Éramos oito, talvez, dez amigos. Ainda me lembro dos nomes de alguns. O João era o mais afoito e o que a gente precisava monitorar. O Nilo era o mais velho, aquele que segurava as nossas ondas e que nos tirava de alguma encrenca.
O domingo estava se aproximando e a expectativa aumentava para chegar à praia e nadar do mucuripe até a draga, ali, um pouco depois da praia que se chamou diários, por conta do clube dos diários.
O trajeto da piedade até o mucuripe era feito a pé, mesmo. Parecia tão curto, talvez pelas brincadeiras que fazíamos. Ninguém se cansava ou reclamava. A paisagem era aconchegante com sítios e tantas fruteiras, que nos alimentavam, de vez em quando.
Na chegada ao mucuripe, antes de começarmos a nadar, era normal uma breve alimentação. Naquele tempo havia uma senhora, Dona Maria, com o seu Joaquim, um português que se acostumou a Fortaleza, que vendia melancias. Eles traziam lá de Aracati. Era uma festa. Todo mundo morto de sede, depois de andar mais de meia hora, comendo melancias. Como era muito barato dava pra comer e ficar satisfeito.
Passada meia hora depois de comer as melancias, alguém dava o comando, geralmente era o Nilo: "Tá na hora, vamos lá". Esse momento era especial. Todos alinhados, lado a lado, olhando o mar e sabendo em que lugar estariam dentro em breve. Eram mais ou menos cinco quilômetros a nado. A maré sempre a favor. Não se pode dizer que não dava certo frio na barriga, mas depois das primeiras braçadas tudo virava um jogo, um jogo em que só havia espaço para a diversão.
E lá iam aqueles meninos, alguns fraquinhos, outros torneados pelas lides diárias, nadando com maestria por um mar que conheciam com a palma da mão. Naquele mar eles eram mestres. Aqueles que não tinham ainda experiência eram amparados pelos outros. Todos se olhavam, todos se ajudavam; quem estava meio cansado era acompanhado de perto por outro até que recuperasse a respiração e o ritmo das braçadas. Naquele mar eles eram adultos.
À chegada sempre havia a preocupação com o mar mais perigoso por conta da draga. Depois que todos saiam, um ar de contentamento perpassava os nadadores; não era preciso dizer nada, percebia-se a expressão de vitória nas faces, mesmo com a respiração ainda ofegante.
Oito ou dez rapazes, na flor da idade, caminhavam de volta pra casa. No almoço, arroz, feijão e ovo. Eta, saudade.
Por José Almeida Martins de Jesus
Éramos oito, talvez, dez amigos. Ainda me lembro dos nomes de alguns. O João era o mais afoito e o que a gente precisava monitorar. O Nilo era o mais velho, aquele que segurava as nossas ondas e que nos tirava de alguma encrenca.
O domingo estava se aproximando e a expectativa aumentava para chegar à praia e nadar do mucuripe até a draga, ali, um pouco depois da praia que se chamou diários, por conta do clube dos diários.
O trajeto da piedade até o mucuripe era feito a pé, mesmo. Parecia tão curto, talvez pelas brincadeiras que fazíamos. Ninguém se cansava ou reclamava. A paisagem era aconchegante com sítios e tantas fruteiras, que nos alimentavam, de vez em quando.
Na chegada ao mucuripe, antes de começarmos a nadar, era normal uma breve alimentação. Naquele tempo havia uma senhora, Dona Maria, com o seu Joaquim, um português que se acostumou a Fortaleza, que vendia melancias. Eles traziam lá de Aracati. Era uma festa. Todo mundo morto de sede, depois de andar mais de meia hora, comendo melancias. Como era muito barato dava pra comer e ficar satisfeito.
Passada meia hora depois de comer as melancias, alguém dava o comando, geralmente era o Nilo: "Tá na hora, vamos lá". Esse momento era especial. Todos alinhados, lado a lado, olhando o mar e sabendo em que lugar estariam dentro em breve. Eram mais ou menos cinco quilômetros a nado. A maré sempre a favor. Não se pode dizer que não dava certo frio na barriga, mas depois das primeiras braçadas tudo virava um jogo, um jogo em que só havia espaço para a diversão.
E lá iam aqueles meninos, alguns fraquinhos, outros torneados pelas lides diárias, nadando com maestria por um mar que conheciam com a palma da mão. Naquele mar eles eram mestres. Aqueles que não tinham ainda experiência eram amparados pelos outros. Todos se olhavam, todos se ajudavam; quem estava meio cansado era acompanhado de perto por outro até que recuperasse a respiração e o ritmo das braçadas. Naquele mar eles eram adultos.
À chegada sempre havia a preocupação com o mar mais perigoso por conta da draga. Depois que todos saiam, um ar de contentamento perpassava os nadadores; não era preciso dizer nada, percebia-se a expressão de vitória nas faces, mesmo com a respiração ainda ofegante.
Oito ou dez rapazes, na flor da idade, caminhavam de volta pra casa. No almoço, arroz, feijão e ovo. Eta, saudade.
Por José Almeida Martins de Jesus
(*) Elaborado pelo filho Alci de Jesus a partir da conversa com o autor
Bacana o texto produzido pelo Alci a partir das memórias do meu pai, em que pese 5 Km de natação no mar...
ResponderExcluirParabéns!!!
Aírton
Belas lembranças!! Sempre muito bom recordar!!
ResponderExcluirNos anos 50, não me recordo bem que ano, eu e mais dois irmãos fomos da praia até a draga; meu pai não queria acreditar quando outro irmão nosso menor falou que tinhamos ido lá; mal dava pra ver tres pontinhos no meio do mar; as ondas estavam altas; estava dificil; meu pai mandou então jangadeiros nos pegar; foi uma aventura inesquecivel! Mas meu pai ficou muito bravo!
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